SHOPENHAUER, A ARTE DE TER RAZÃO E A PÓS-VERDADE NA ERA DIGITAL

Por Cláudio Correia de Oliveira Neto
Historiador Licenciado- UFRN
Especializando da Educação de Jovens e Adutos no contexto da Diversidade - IFRN
Técnico de Nível Médio Integrado em Controle Ambiental- IFRN
correia.claudio@rocketmail.com
Todos os anos o Oxford Dictionaries elege a palavra do ano. Para 2016 a eleita foi a “pós-verdade”. Empregada pela primeira vez em 1992 pelo dramaturgo sérvio-americano Steve Tesich, ela tem aparecido há cerca de uma década no vocabulário acadêmico , mas apenas recentemente tem sido mais cotidianamente aplicada. Segundo dados o uso da palavra cresceu 2.000% em 2016. Além de elege-la a Oxford também a definiu como um adjetivo “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”. Analistas políticos, historiadores e demais profissionais das ciências humanas e sociais tem recorrido ao conceito de pós-verdade para explicar fenômenos como a vitória de Donald Trump a presidência dos Estados Unidos, a saída do Reino Unido da União Europeia e o impeachment de Dilma Rousseff.
            Em plena era digital as informações se amontoam, correm velozmente entre os bilhões de usuários das redes sociais, e é difícil separar o joio do trigo, o que é verdade e o que trata de falácia. O sistema logarítmico utilizados nas redes sociais também contribuem para a construção de bolhas ideológicas, que retroalimenta determinas ideologias, reforçam extremismos e miopias. Como bem colocaram Umberto Eco e Carlo Ginzburg em seus estudos sobre a era digital a internet democratizou tudo, inclusive a idiotice. Celulares, tabletes e computadores se tornam um grande autofalante, onde há muitos falante e nenhum ouvinte. Além da dificuldade de selecionar a informação verídica da falaciosa vivemos uma polarização cada vez maior com uma extrema direita raivosa que avança como uma tsunami.  Dentro deste contexto a razão sucumbe as paixões mundanas. Estes fatores criam um terreno fértil para germinar e difundir a pós-verdade. Nesta nova configuração da realidade o juízos de valores já estão pré-moldadas e não argumentação que convença as mentes apaixonadas por suas ideologias.  Vence o debatedor que arrebatar mais corações.
            Neste contexto a crítica irônica feita por Schopenhauer, quase duzentos anos depois, tornasse uma amarga prática antidemocrática da sociedade ocidental do século XXI.  "A Arte de ter Razão" dialoga muito com a concepção de pós-verdade, em ambos os casos como declara o próprio Schopenhauer "afinal de contas é em ganhar que você está interessado, não na verdade". Nesta empreitada pela vitória a todo custo o autor estabelece 38 princípios que auxiliam o debatedor a lograr êxito sobre o oponente mesmo que o vencedor não tenha razão e nem faça uso da lógica formal.  Aqui nos debruçaremos apenas em oito que são mais usadas no ciberespaço.
            A primeira estratégia adotada é a de generalizar a ideia do oponente e restringir a sua. Ideias mais generalizadas são mais fácil de serem atacadas, e quanto mais recortada é a sua ideia mais palatável ela se torna ao público. Um exemplo prático de como isso se dá é em um debate sobre o aborto A generalizar a ideia de infanticídio para todas as mulheres e colaboradores que fizeram aborto e estendendo a ideia de assassinato fetal a todas as crianças.
            A segunda estratagema é a manipulação semântica, substituir uma determinada palavra ou expressão por outra que possibilite expressar a conclusão final. Uma exemplificação da aplicação dessa técnica é por exemplo ao invés de adotar o termo menor em conflito com a lei levar ao público a deduzir que se é alguém (generalização) em conflito com a lei, logo outro termo semântico que pode ser dado a uma pessoa na mesma situação é o de criminoso. Ao substituir paulatinamente uma expressão por outra ele leva a concluir que o menor é um criminoso e portanto deve receber a penalidade de um.
            Outra técnica apresentada é a de mostrar situações em que o opositor defendeu a ideia oposta à anterior. Seguindo ainda o exemplo sobre o debate acerca da redução da maioridade penal mostrar que A, que é contra a redução em algum outro momento apresentou posicionamento favorável à redução.
            Além das já supracitadas é possível ainda recorrer a fuga do especifico para o geral. Se o caso configura a discussão sobre a incerteza sobre um fato concreto alargar este princípio para a própria incerteza da vida. Está técnica é o uso inverso a primeira aqui apresentada. A generalização pode ser usada tanto contra ao adversário contra a favor do debatedor.
            Como "A Arte de ter Razão" não se baseia em elementos racionais, mas sim no recurso emocional. Assim sendo é óbvio que entre os recursos para a obtenção da vitória está em manipular a emoção do adversário. A sugestão de Schopenhauer é investir na raiva do adversário, ao irrita-lo a chance do oponente perder o fio da argumentação aumenta.
            É possível ainda vencer o adversário associando a sua imagem a um rótulo odioso da sociedade. Em vários momentos durante o debate eleitoral de 2014 a candidata Dilma Rousseff associava ao seu oponente o rótulo de privatista, a privatização é vista por parte dos brasileiros como um ato antinacional e entreguista. O simples rótulo já fazia que os argumento do outro candidato ficavam invalidados socialmente.
            Apelar para persuadir a vontade do tribunal também é validado. Isso pode ser feito usando argumentos que se enquadrem no desejo dos envolvidos, por exemplo, aos juízes interessa a justiça, credibilidade, honra, bem comum e as leis.  Argumentos que apelem para este lado tendem a ser mais exitosos.
            Como último recurso nos é apresentada a ofensa pessoal pura e simples. Um confronto direto que provoque o adversário até que perca a razão e os argumentos. Denegrir a imagem do oponente de maneira a ainda que os argumentos por ele sejam plausíveis não seja palatável a vitória dele.
             A pós-verdade e a vitória do belo argumento sobre o bom argumento acaba aprofundando nossa crise ética. Vários setores da sociedade já começam a se preocupar com a contaminação da esfera e da opinião públicas por mentiras e calúnias divulgadas na rede com o objetivo de manipular a opinião pública. Acirando extremismos, polarizações, ideologias antiética e criminosas que vão contra os interesses do bem comum. É necessário retomar o apresso pela verdade tangível, observando a lei, a argumentação racional e ética e os valores estabelecidos socialmente.



                                                                                                                                              

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