Imaginário escolar sobre a Idade Média : abordagem histórico-pedagógica (PARTE 01)



Por Cláudio Correia de Oliveira Neto
Historiador Licenciado- UFRN
Técnico de Nível Médio Integrado em Controle Ambiental- IFRN

Dentro da Ciência História existem assuntos que chamam mais atenção do que outros sejam pelo grau de identidade ou alteridade contido neles. Entre essas temáticas chamativas está o período da Idade Média, ainda mais especificamente a Inquisição Medieval. Como posto na letra da música “Agora é moda” da cantora Rita Lee “Agora é moda, a inquisição da Idade Média”. A Idade Média é um sucesso na sociedade de consumo contemporânea, de series televisivas até livros. O interesse justificasse pela áurea de estranhamento presente principalmente por um preconceito histórico que rotula o período como uma “Idade das Trevas”. Preconceito esse retroalimentado pela ignorância acerca desse período e uma dificuldade de pensar historicamente.
Pensar historicamente é um exercício de alteridade, se colocar no lugar do outro e tentar recuperar o tempo próprio das coisas e dos acontecimentos (CERRI, 60 :2011). Sem este exercício torna-se impossível recuperar o sentido dos fatos e compreender os acontecimentos da época. Sem o pensar historicamente o individuo é privado de beneficiar-se do método da história e se posicionar diante dos fatos presentes a partir da interpretação de suas relações com o passado, prejudicando sua orientação temporal (CERRI, 61:2011).
Durante as vivências do Estágio Supervisionado de Formação de professores II (História) realizado pelo aluno Cláudio Correia de Oliveira Neto e Poliana Cláudia Martins da Silva, 7º período do Curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (Campus Natal/Central) foi detectada a curiosidade acerca do período. No dia 22 de Março de 2013 foi ministrada a aula de história na metodologia de aula expositiva dialogada, método escolhido pelo professor devido à correria de fim de ano letivo de 2012. Devido a uma greve de 3 meses o calendário da Instituição está no 4º bimestre do ano letivo de 2012. O assunto a ser trabalhado é a Idade Média na perspectiva social e cultural privilegiando o estudo sobre o papel da Igreja nesse período. Os alunos demonstraram interesse acerca da Inquisição Medieval, Bruxaria e Instrumentos de tortura apresentados na exposição do professor. O interesse sobre a Inquisição Medieval se refletiu nas demais turmas do professor-tutor, mas devido ao calendário acadêmico do ano letivo de 2012 se encerra dia 30 de abril de 2013 não houve tempo para suprir a carência e curiosidades do alunado sobre a temática.
As discussões sobre a Inquisição Medieval é de relativa importância num momento em que o discurso religioso ganha força na atualidade e direcionasse ao ataque a minorias religiosas. Nas palavras do historiador responsável pelo Museu da Inquisição em Minas Gerais ele assim justifica a importância da questão:
“Ainda hoje, se assiste a uma série de discursos de demonização e ações violentas contra grupos religiosos de matrizes africanas, principalmente por parte de determinados grupos cristãos. Resgatar essa memória histórica de perseguição[..] é contribuir para o fim de da intolerância, preservando a livre expressão de fé.[..]”.(CUNHA,1:2012. )
Discutir a Inquisição Medieval sobre a perspectiva de um exercício de se pensar historicamente possibilita ao aluno:
“[...] nunca aceitar as informações, ideias, dados etc. sem levar em consideração o contexto em que foram produzidos: seu tempo, suas peculiaridades culturais, suas vinculações com posicionamentos políticos e classes sociais, as possibilidades e limitações do conhecimento que se tinha quando se produziu o que é posto em análise. É nunca deixar de lado que todo produto de uma ação tem um ou mais sujeitos em sua origem, e é decisivo saber quem são esses sujeitos pois isso condiciona o sentido da mensagem.”(CERRI,59: 2011)
Colaborando assim para combater a questão da intolerância tendo em vista que o Método Histórico como explica Cerri:
“Por trata-se de método cientifico, o método histórico supõe, como única verdade, que o melhor argumento deve prevalecer no processo de discussão de ideias. Portanto o conhecimento é provisório, e nossas “verdades” só merecem esses título quando continuamente submetidas a tese e à possibilidade de refutação. Do contrário, construiríamos dogma, que é o oposto do saber cientifico .”(CERRI,66: 2011)
Como colocado por Fernandes os erros interpretativos sobre o período consiste na utilização de critérios do tempo presente sem observar a inaplicabilidade de tais critérios para o período em estudo. A descontextualização dados em estudo provocam as distorções interpretativas. Outra fonte de distorção é pesquisas com um juízo de valor já cristalizado que fazem uso dos documentos para confirmar os estereótipos. Para Fernandes a maior dificuldade é resgatar uma das principais características da Idade Média que é sua intensa religiosidade. O autor explica:
Se hoje o fator religioso é percebido como algo estranho à vida, para o homem medieval, ao contrário, a esfera do sagrado era reconhecida presente e encarnada nas contingências da vida quotidiana. Congregados pelo irresistível apelo da religião, homens e mulheres de todas as regiões da Europa adquiriram, a partir do século X, a consciência de formar um povo único, uma entidade que pretendia espelhar e prefigurar a ordem celeste: a Cristandade. “Cada um”, observa Daniel-Rops, ”trabalhando ao longo de sua existência, tinha a certeza de colaborar numa grande obra que o ultrapassava”, contribuindo com sua pequena pedra para levantar a catedral, segundo a imagem utilizada por Paul Claudel. A “extraordinária capacidade que os homens da Idade Média tinham de pensar e agir em conjunto” deve-se, portanto, ao fato de que “o sentido da transcendência arrancava o indivíduo da sua condição particular (...) para impulsioná-lo rumo a um ideal absoluto, tal como uma terra santa a ser libertada, uma igreja a ser construída, ou então, com obstinada candura, um herege a ser queimado vivo”. Quem negligenciar esse dado prejudicará gravemente sua capacidade de compreensão histórica: como descrever as Cruzadas ou a Inquisição sem levar em conta o fato de que a religião era o cimento da sociedade medieval?” (FERNANDES, 3: 2013)
            Em sua reflexão a respeito dos estudos da Idade Média a proposta apresentada por Fernandes para superar as distorções é o maior cuidado com as fontes, pois elas dão conta de uma maior complexidade ao sentido da época. A submissão às fontes é o caminho por ele apontado para uma discussão mais cientifica sobre esse importante período. Apesar do uso do termo “submissão” ele deixa claro que é o pesquisador que faz com que a fonte fale, portanto é necessário que esse profissional esteja munido teórico e metodologicamente para produzir a partir das possibilidades que a fonte disponibiliza.
Baseado nas observações da monitoria foi possível detectar, a curiosidade e dificuldade de compreender o conteúdo sobre a Inquisição Medieval, dificuldade agravada pela corrida contra o tempo que o calendário da instituição coloca. A intervenção então é pensada na tentativa de sanar as dúvidas, as curiosidades e as dificuldades do alunado. Para melhor mapear as deficiências a equipe fez uso de um inventário de dúvidas e curiosidades. O diagnóstico do inventário foi que os alunos possuíam uma dificuldade de empatia temporal, ou seja, "resgatar o tempo próprio das coisas sobre as quais se pensa" (CERRI. 60:2011). Além disso, havia uma dificuldade a nível historiográfico, as interpretações acerca da Inquisição eram condicionadas pelo o objeto de estudo causando deformações na compreensão. Se partirmos do referencial econômico a Inquisição é interpretada como a tentativa por parte da Igreja que acumular riqueza, se o referencial for o político a inquisição se resume a disputa por poder ou as relações de poder, do ponto de vista da História Cultural se trata como uma questão de mentalidade da época. Nenhumas das explicações conseguem dar conta da real complexidade da Inquisição, pois ela atravessa todas essas questões. 


Na busca de atender as carências diagnosticas o caminho encontrado foi o indicado por Fernandes, ou seja, uso de fonte documental primária que dê conta da exemplificar a complexidade e resgatar o tempo próprio da Inquisição. Atividade essa que deseja fornecer arsenal teórico- metodológico que contribua para  combater a intolerância. A documentação selecionada para a análise foram três bulas papais: Ad Abolendam (1184), Vergentis in senium (1199) e Ad Extirpanda (1252). Elas estão diretamente relacionadas as diretrizes que a Igreja estabelece para a Inquisição.

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