MODERNO ESPITUALISMO: ENCRUZILHADAS DO IMAGINÁRIO POLÍTICO COM O IMAGINÁRIO RELIGIOSO

Cláudio Correia de Oliveira Neto
Curso de História-CCHLA-UFRN
correia.claudio@rocketmail.com



SILVA, Marcos José Diniz. República e “religião social”: maçons, espiritas e teosofistas no espaço público cearense. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais, Vol. 7  Ano VII  nº 3, Set./ Out./ Nov./ Dez. de 2010.
           


O imaginário politico e o religioso sempre se encontram nas encruzilhadas da História. Mesmo numa sociedade que se considera laica o fator religioso ainda habita no Estado com nuanças mais singelas e cores mais pardas ou não. Apesar da tentativa de neutralidade e separação presente desde a Idade Moderna, fica cada vez mais claro que o ser humano não é fragmento, no sentido de ser ora uma coisa ora outra enquanto desempenha seu papel social. No teatro da vida os papéis mais diversos que interpretamos se entrelaçam de maneira tal que fica difícil dissociar as diversas áreas em que atuamos.  Nas redes sociais há apelos para limitar o acesso de determinados grupos religiosos a instituições representativas, justificando a iniciativa como a defesa da laicidade do Estado Democrático. Qual o espaço da religião na política? É uma pergunta que vem sendo debatida a um longo tempo. Tais discussões ganham especial importância com o cientificismo do final do XIX e inicio do XX , na luta pelo Estado laico e democrático. Na História do Brasil esse questionamento ganha força com o advento do Regime Republicano que trouxe duas novas condições de confronto: o Estado separado da Igreja e a liberdade de culto.  
Entre os historiadores que enfrentam a questão está o Marcos José Diniz Silva.  Ele é Graduado e Especialista em História, Mestre e Doutor em Sociologia, atualmente é professor do Curso de História da  Faculdade  de  Educação,  Ciências  e  Letras  do  Sertão  Central  –  FECLESC-UECE  (Campus Quixadá-CE).  Com vários artigos publicados sobre maçonaria e espiritismo no Ceará , é autor do livro “No compasso  do  progresso:  a  maçonaria  e  os  trabalhadores  cearenses”. Entre seus artigos publicados, um chama a atenção por se deter especificamente na analise da atuação de maçons, espíritas e teosofistas no espaço público cearense no período da Primeira República. O artigo intitulado de “República e “religião social”: maçons, espiritas e teosofistas no espaço público cearense”, publicado no segundo semestre de 2010 pela Fênix – Revista de História e Estudos Culturais, tem como carro-chefe mostrar o enlace religioso, social  e  político no cenário da Primeira República. É justamente por deixar explicito o cruzamento do imaginário político com o religioso que darei ênfase a tal artigo.


Para melhor analisar o conteúdo do artigo se faz necessário explicitar o local de fala, em especial a revista que o publicou. A Revista Fênix é uma publicação eletrônica nacional que atua pelo site www.revistafenix.pro.br em funcionamento desde dezembro de 2004, e tem como objetivo trazer ao público uma publicação que tem como pilar  a agilidade, universalidade e gratuidade. Segundo o mais recente editorial da própria Fênix o seu grande propósito é “tornar acessível uma publicação capaz de incentivar a interlocução acadêmica e a ampla divulgação de pesquisas instigantes e de alto nível, procurando traduzir à dinâmica e a diversidade dos diálogos interdisciplinares da pesquisa histórica e dos Estudos Culturais”. O caráter interdisciplinar da revista favorece um olhar complexo sobre a relação entre o político e o religioso. Foi também esse olhar interdisciplinar que possibilitou, que em tão pouco tempo, se consolidar no meio acadêmico. Podemos comprovar sua consolidação quando em 2006 ela passa a ser incluída no Portal de Periódicos de Acesso Livre da CAPES e em um importante indexador internacional, o DOAJ - Directory of Open Access Journals.
O artigo está dividido em Religião e Espaço Público; O Moderno-Espiritualismo de maçons, espiritas e teosofistas; Desigualdades, “Questão social” e evolução espiritual e as Considerações Finais. No primeiro item em discussão o autor desmonta a tese do “desencantamento do mundo”, a ideia geralmente em uso é de que a laicização do Estado está relacionada a uma descrença na religiosidade. A ideia que Silva defende é que na verdade a separação entre Estado e Igreja possibilitou que outras religiosidades para além da católica chegassem ao espaço público. Ser laico não significa ser ateu. Com a secularização ocorre  “a  expansão  das  práticas  religiosas  no  espaço  público  em  condição  de igualdade jurídica com o culto católico” (SILVA,2010). O autor desconsidera que enquanto está ganhando espaço está espiritualidade moderna e elitista simultaneamente há o combate as religiosidades de matrizes africanas, consideradas como espiritismo inferior, eram duramente perseguidas, sendo negado a elas o mesmo espaço público que espiritas, maçons e teosofistas ocupavam.
No segundo item fazendo uso de fontes primárias como o “Livro dos Espíritos”, “Glossário Teosófico”“Ritual do aprendiz maçom” ele mostra as aproximações e afastamentos entre os grupos que compunham o moderno-espiritualismo , além de contextualizar o surgimento dessas novas religiosidades. Para o autor essa espiritualidade é resultado da carência da época por uma religiosidade dentro dos padrões da racionalidade cientifica. Para firmar essa ideia Silva usa o conceito de “religião social”, conceito esse que é basilar, porém não explicitado e nem discutido pelo autor. Esse vácuo que o texto cria dificulta uma compreensão mais sofisticada do texto, todavia estimula a curiosidade do leitor. O Moderno-espiritualismo, portanto abarca um grupo heterogêneo que se une por não se enquadrar na religiosidade tradicional e necessitar de algo que vá além da pura cientificidade.
No terceiro item Silva faz uso de artigos de jornais do período, onde essa rede de intelectuais do moderno-espiritualismo cearense se posiciona politicamente a respeito das questões sociais. A partir dos documentos ele mostra que as explicações espirituais são usadas no embate politico e social. Um dos artigos analisados chega até mesmo a afirmar que o problema do operariado cearense não é econômico ou social, mas sim cármico. Com base na análise dessa documentação em especial o autor propõem em suas considerações finais que os interesses dos modernos- espiritualistas em grande medida “era condizente com os  interesses  disciplinares-civilizatórios  da  burguesia  e  classes  dominantes  locais”.
Em suma o artigo do Silva nos mostra os entrelaçamentos do imaginário religioso que se constrói na Primeira República com todo o imaginário politico já existente, e como eles por meio de uma sofisticada costura de intelectuais os fazem funcionarem a favor dos interesses de uma elite intelectual e econômica. Contudo falta o autor debater sobre a relação dessa rede intelectual com a rede de intelectuais católicos que formam uma importante frente de batalha nesse período na luta por restaura o seu poder político no espaço público.




Autor/instituição: SILVA, Marcos José Diniz.  Curso de História da  Faculdade  de  Educação,  Ciências  e  Letras  do  Sertão  Central  –  FECLESC-UECE  (Campus Quixadá-CE).
Título do artigo: República e “religião social”: maçons, espiritas e teosofistas no espaço público cearense.
Nome e instituição da Revista: Fênix – Revista de História e Estudos Culturais

Endereço eletrônico: www.revistafenix.pro.br 

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