O OPERARIADO BRASILEIRO PRÉ-REVOLUÇÃO DE 1930: UM BALANÇO HISTÓRIOGRÁFICO

Por Cláudio Correia de Oliveira Neto
            A historiografia tradicional da década de 1970, na figura de Boris Fausto, defende que as limitações estruturais, que favoreciam a heteronomia sindical, geram um movimento operário débil, o que leva o movimento a uma sucessão de derrotas. A influência do movimento anarquista, na visão do historiador citado anteriormente, impossibilita uma luta no campo político, uma vez que Fausto não reconhece no combate prático das relações de produção um aspecto político. A não formação de um partido político ou sindicato constitui um erro tático que além de dificultar a formação da classe operária ainda a afasta do espaço de poder representativo. Ainda na introdução da obra “Trabalho urbano e conflito social (1890-1920)” Fausto defende que a luta fundamental não se define entre uma burguesia agrária e a classe operária, pois o operariado brasileiro é apenas uma mancha do imenso oceano agrário.
            Em contraponto a essa visão sobre a classe operária Michael M. Hall e Paulo Sérgio Pinheiro fazem um esforço de tentar compreender a formação do movimento operário brasileiro não pela comparação com outros países, mas considerando as múltiplas determinações do caso brasileiro. Para esses autores o passado agrário brasileiro não pode ser encarado como um ponto negativo ou enfraquecedor da formação do proletariado nacional. Com base em pesquisas recentes eles nos mostram o caráter combativo das relações no campo, com numerosos casos de greves rurais. O elemento imigratório, que por muitas vezes é colocado como fator de uma formação e/ou organização da classe operária brasileira, se demonstra no texto de Hall e Pinheiro como elemento fragilizador do movimento operário. Muitas vezes as organizações trabalhistas e greves fracassavam por disputas internas detro de uma mesma nacionalidade e a diversidade de nacionalidades era mais um fator complicador na formação da classe operária. Hall e Pinheiro apontam a necessidade de se pensar a burguesia brasileira, que é composta por vários tipos de capitais e que possuem interesses conflitantes, mas no jogo interno da classe elas se rearranjam sem que necessariamente ocorra uma “vazio no poder”. As disputas no núcleo da burguesia, segundo os autores, são acontecimentos rotineiros de uma sociedade capitalista. O que para Fausto se caracteriza como apatia e falta de consciência de classe no movimento operário é resignificado por Hall e Pinheiro como dupla consciência. A questão da dupla consciência trata-se de saber que está sendo oprimido e que precisa fazer algo contra, contudo as condições materiais o impedem de reagir, ou seja, lutar contra o patrão quando necessita ficar no emprego para sustentar a família o faz optar por outras estratégias de luta.
            A questão da luta é retomada por Edgar De Decca e Boris Fausto, o primeiro ressaltando a existência de ação do operário e descontruindo a tese da desorganização do movimento operário. O segundo ressalta um debate iniciado em “Trabalho urbano e conflito social(1890-1920)”, defendo que a luta fundamental não se define entre burguesia agrária e classe operária. De Decca marca temporalmente 1928 como momento em que as propostas políticas das mais diferentes classes definiam o real delas e as direções desejáveis, em especial no recorte espacial de São Paulo, local onde a contradição entre capital e trabalho era efetivado na discussão sobre a questão democrática. Ao contrario da tese de uma burguesia industrial incipiente, como coloca Fausto, De Decca demonstra que a burguesia industrial não era débil e nem irrelevante no âmbito politico e econômico do país, ao ponto de ter e efetivar um projeto nacional. O conflito fundamental negado em Fausto encontrasse no texto de De Decca como movimento motor da luta de classe. Luta essa que pode ser representada pelo CIESP como agente de luta de classe produtora de um discurso homogeneizador sobre a industrialização e tendo seu contraponto no Bloco Operário e Camponês.
            O BOC é um argumento claro para provar a existência de uma organização do movimento operário. Movimento esse que não é apático, mas que opta por uma estratégia de apoio a uma revolução democrático-burguesa. A concepção de revolução democrática-burguesa é apoiada pelo BOC por esse entender que existia um inimigo comum entre uma ampla frente de oposição, era a oligarquia o inimigo. Essa frente ampla era composta por dissidência da oligarquia (Partido Democrático), tenentistas e classe operaria, embora tivessem muitos pontos em comum elas divergiam quanto a direção política. Todos acreditavam que a revolução era necessária e que é a figura do “revolucionário” que deve direcionar a revolução, apoiado pelo PD e o BOC. O afastamento do BOC da direção política do movimento ia contra o projeto proletariado, uma vez que só podemos considerar revolução quando a direção é do proletariado. O realinhamento do BOC com o projeto proletário muda o jogo político, e o proletariado de um aliado alienado passa a ser um perigo, por isso deve ser afastado da revolução de 1930.
            Para Fausto é impossível conceber um vinculo entre 1930 e a burguesia industrial. O caráter agrário do país impossibilita uma luta de classes no molde tradicional e a própria atuação do proletariado. O que ocorre em 1930 é uma redistribuição do poder entre a elite, visto que a burguesia cafeeira não tinha condições politicas e econômicas de sustentar sua hegemonia. O que ocorre não é um vazio do poder na qual o Estado de compromisso é a solução. O Estado de Compromisso é portanto o reajuste interno das relações das classes dominantes que se caracteriza como centralizador, intervencionista e racionalizador. O Estado de Compromisso encontra no exercito o seu fiador, e através de um movimento de homogeneização da instituição suprime o tenentismo.

            Em comum tanto De Decca quanto Fausto concordam que a revolução de 1930 é um acordo entre as classes dominantes, sem correlação direta com a Crise de 1929 e de âmbito politico.

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